Campanha promove um Carnaval sem gordofobia nos blocos e sambódromos
"Querem nossos corpos gordos, mas isso não pode ser assumido nem anunciado", expõe uma das criadoras do projeto.
Durante uma conversa em que planejavam onde passariam o Carnaval 2020, a pesquisadora Gabriella Morais e a modelo Luana Carvalho se depararam com um questionamento: como elas, duas mulheres gordas, conseguiriam aproveitar o feriado sem sofrer gordofobia? Pautadas em questões do cotidiano e buscando combater o preconceito, a dupla lançou então a campanha #CarnavalSemGordofobia.
“Queríamos oferecer um ambiente menos hostil para nossa comunidade gorda e vimos que tínhamos potencial para fazer algo maior do que só chamar pessoas gordas para curtir o Carnaval”, explicou Luana, uma das idealizadoras do projeto. A primeira postagem na conta do Instagram promove o seguinte questionamento: “o que você faria se pudesse curtir um Carnaval sem gordofobia?”. Na legenda da publicação, Luana aproveita para contar que não teria medo de pegar transporte público, usaria uma fantasia sem se preocupar em mostrar certas partes do corpo, iria para o bloco para se divertir, não apenas pensando em qual frase gordofóbica iria ouvir, e dançaria sem receios.
O fato de o feriado ser festejado durante o Verão, estação do ano ainda tão marcada pelo ideal do “corpo perfeito de praia”, estimulado pelos ultrapassados padrões de beleza, só contribui mais e mais para a insatisfação das mulheres com a própria aparência. “Além da gordofobia ter origens machistas de controle sobre o corpo da mulher, contribuindo para que pessoas gordas sejam excluídas desses espaços que celebram o Verão, como é o caso do Carnaval“, opina Luana.
Durante os festejos, a pressão estética sobre os corpos femininos aumenta e figuras como a Globeleza intensificam a sexualização da mulher negra, como destacam as idealizadoras da campanha, que também se preocupam com essa questão. “Felizmente, temos iniciativas de passistas gordas que desfilam nas escolas de samba, como é o exemplo do Plus Samba, em Porto Alegre e no Rio de Janeiro“, conta Luana carvalho.
Para Gabi Morais, as pessoas vão para um bloco porque se identificam com a música e/ou com a temática dele. Nem todos os bloquinhos têm como proposta promover a representatividade, mas todos deveriam bater na tecla do respeito, da empatia e da antigordofobia, como destaca a pesquisadora. Além disso, o governo também deveria promover ações de combate à gordofobia. “Os blocos deveriam apoiar movimentos como o nosso, que estejam dispostos a falar sobre o assunto. Esse apoio pode vir em forma de dinheiro, para a confecção de materiais físicos a serem distribuídos nos blocos, ou até mesmo pela divulgação da campanha nas redes sociais”, aponta.
No Twitter, com a hashtag #CarnavalSemGordofobia, muitas garotas compartilham seus relatos e apoiam a iniciativa:
uma vez tava super feliz fantasiada de diabinha com uma amiga e um ônibus CHEIO de gente podre e suja na janela literalmente começou a gritar “capeta gorda, capeta feia”. todo mundo olhou. eu chorei no ônibus voltando pra casa.#CarnavalSemGordofobia
— $$ 𝕯𝖔𝖑𝖆 $$ (@18siss) 13 de janeiro de 2020
Gabi e Luana também alertam para o fato de que a gordofobia estimula a fetichização dos corpos gordos. “Como mulher gorda, sinto que a abordagem durante o Carnaval é um pouco mais violenta em dois sentidos: primeiro, acham que nós temos a obrigação de aceitar qualquer negócio, pois, na cabeça de certas pessoas, estamos desesperadas e ninguém vai nos querer; segundo, de uma forma silenciosa, querem nossos corpos, mas isso não pode ser assumido nem anunciado”, diz Gabi.
Para promover ainda mais a campanha, a dupla publicou um “Manual de como não ser gordofóbico no Carnaval” no Instagram. Assim, não tem desculpa para pessoas irem com fantasias preconceituosas ou despejarem falas gordofobia disfarçadas de “zoeiria”.
Por um Carnaval sem gordofobia, sem assédio e sem racismo!