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Empresas de games continuam errando e estimulando a misoginia e o machismo

Caso envolvendo a streamer Gabriela Cattuzzo traz à tona uma reflexão sobre a indústria de jogos e como as mulheres ainda são tratadas nela

Por Isabella Otto Atualizado em 25 jun 2019, 17h46 - Publicado em 25 jun 2019, 15h30

Desde 2016, levantamentos relacionados ao mundo dos games mostram que mulheres são as que mais consomem jogos no Brasil. No último ano, a Pesquisa Game Brasil mostrou que 75,5% dos brasileiros são gamers de algum nível, sendo que 58,9% desse número é formado por pessoas do sexo feminino. Ou seja, isso prova que o universo dos jogos eletrônicos é receptivo, livre de machismos e seguro para mulheres. Se você não localizou a ironia nas linhas anteriores, talvez seja hora de desligar um pouco o console e se inteirar dos fatos mais recentes, que dão uma panorama geral do que é a indústria dos games.

Gabriela Gattuzzo vestindo camiseta da Razer Reprodução/Reprodução

Gabriela Cattuzzo é streamer do Facebook e influenciadora contratada por algumas marcas, como a Razer Brasil. No último dia 21, ela postou um tweet dizendo: “Sempre vai ter um macho fodido pra falar merda e sexualizar mulher até quando a mulher tá fazendo uma piada, né? É por isso que homem é lixo“. O post dividiu opiniões e viralizou. Alguns, em sua maioria mulheres, concordavam com a influenciadora. Outros, em sua maioria homens, se sentiram ofendidos com a generalização. Teve gente até dizendo que Gabi estava praticando misandria, que é quando um ato de desprezo ou ódio contra o sexo masculino é cometido. Aparentemente, a gamer estava criticando mais uma sexualização sofrida na profissão e usou “boy lixo”, uma expressão já bastante banal, para descontar sua raiva. Há machismo aí também, embora nem todos fizessem questão de enxergar.

O caso repercutiu tanto que a Razer Brasil finalmente decidiu se posicionar sobre ele. Dentre as muitas coisas que foram ditas no comunicado oficial, que você pode conferir na íntegra mais abaixo, gostaríamos de ressaltar algumas na sequência:

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O tweet polêmico da Gabi. Reprodução/Reprodução
  • “estamos desde o começo, como gamers, enfrentando todo tipo de preconceito e estereótipo, e continuaremos lutando para que esse tipo de situação não se repita”
    A empresa Razer é a líder mundial em Sistemas Profissionais, periféricos e software de games. Ela vende uma série de produtos para os jogadores e possui filiais em algumas partes do globo, além de patrocinar alguns dos principais times masculinos de e-Sports, como o paiN Gaming, no Brasil. Como era esperado, a maioria dos cargos da Razer é ocupada por homens. Min-Liang Tan é o CEO da marca. Na América Latina, o diretor é Vitor Martins. Mais uma empresa de jogos formada majoritariamente por homens e tendo cabeças pensantes do sexo masculino. Tudo bem, o cenário está mudando, uma passo de cada vez. Agora, fica complicado dizer que esses caras sabem o que é sofrer diariamente preconceito e com estereótipos no mundo gamer, porque eles não sabem. A sexualização feminina no mercado existe e é inclusive alvo de pesquisas em universidades renomadas, que tentam entender como a cultura nerd machista moldou as personagens femininas que encontramos em games e os consumidores.

 

  • “(…)a opinião da empresa, que é totalmente contrária a qualquer tipo de discriminação seja ela de sexo, religião, partido político ou qualquer tipo de intolerância e extremismo”
    Se a empresa se diz tolerante, não deveria ela ter tentado entender o que levou a streamer a criticar de maneira genérica os homens antes de expôr a jovem dizendo que ela não é embaixadora da marca, apenas uma influenciadora, e que o contrato com ela não seria renovado? Os homens que Gabi atacou existem e, infelizmente, ditam as principais características negativas do mercado, conhecido por ser machista, misógeno, sexista, intolerante e preconceituoso.
  • “o contrato com a influenciadora em questão não será renovado”
    Gabi, por ser uma influenciadora gamer, deveria tomar mais cuidado com as palavras ao se referir ao público que a acompanha? Profissionalmente, talvez fosse uma boa escolha. Ela também já teve algumas atitudes não tão bacanas, que foram revividas após a polêmica. Ela se desculpou por elas: “Fui babaca”, disse sobre erros do passado. Além disso, ela também falou que concorda que possa ter ofendido pessoas com o tweet recente, mas que a galera deveria entender que ela posta “fotos todos os dias, e todos os dias a maior parte dos comentários são ofensivos ou sexualizando algo que nem tem como ser sexualizado. São poucos os homens que comentam com coisas interessantes ou comentários não ofensivos”. O contrato de Cattuzzo foi cortado. Ela deu um tempo das redes, pois estava sendo ameaçada, assim como sua família e seus amigos. Os gamers que a assediaram e aqueles outros que tiveram suas masculinidades frágeis afetadas pelo “insulto” de Gabi saíram vitoriosos. Read. Fight. O machismo ganha novamente. Fatality. Game over.

Muitos influenciadores que fazem parte do universo gamer e nerd se posicionaram sobre o ocorrido, como Castanhari, Cellbit, Felipe Neto e Mikannn. Todos se mostraram descontentes com o comunicado liberado pela Razer e pelas razões pelas quais Gabriela teve o contrato finalizado. E se fosse o contrário? E se um streamer tivesse postado que “é por isso que mulher é lixo”? Será que o tweet teria viralizado em tais proporções? Será que a empresa teria finalizado a parceria com o influenciador?

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Diariamente, mulheres escutam que só são maioria no mundo gamer por causa dos jogos mobile, e que estão nos torneios para agradar ou procurar macho. Profissionais incríveis recebem comentários de cunho sexual e são analisadas pelas roupas, curvas e tatuagens, dificilmente pelo conteúdo que estão entregando. Meninas utilizam nomes masculinos em partidas online por medo de serem ameaçadas, minimizadas e boicotadas. Diariamente, a gente escuta que o mercado está mudando, que cada vez mais mulheres estão tomando espaço em desenvolvedoras, competições de e-Sports e torneios amadores. E é verdade, um movimento incrível está acontecendo e empoderando meninas que, assim como eu, sempre amaram videogame, mas ouviam que era coisa de menino e que não tinha espaço para elas. A gente está caminhando, fazendo nossa parte. Onde estão as empresas de games? Por que elas continuam resistentes em caminhar com a gente? Por que elas continuam incentivando o mercado machista que ajudaram a construir? A história muda, assim como os personagens e sua jogabilidade, mas o desfecho é sempre o mesmo. E isso que é um lixo.

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Clique aqui para conferir na íntegra o comunicado liberado pela gamer Gabi Cattuzzo sobre o assunto.

 

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