Existe diferença entre amar e estar apaixonada?

Conversamos com um psicanalista para entender duas coisinhas que o ser humano ainda não conseguiu compreender por completo: amor e paixão. Dá para explicar?

Por Isabella Otto Atualizado em 17 ago 2019, 10h01 - Publicado em 17 ago 2019, 10h01

Sem mais delongas, a resposta para a pergunta do título é: sim, existe diferença entre amar e estar apaixonada. Apesar de muitos acharem que é a mesma coisa, esses dois estados de espírito são distintos O psicanalista Alexandre Pedro, formado pela Sociedade Internacional de Psicanálise de São Paulo, gosta de dizer que são sentimentos em estágios diferentes que manifestam em nós sensações únicas, inexplicáveis e até mesmo desconhecidas. É possível que a paixão evolua e vire amor. Também é possível que eles caminhem lado a lado. E também pode acontecer de a chama da paixão se apagar antes que ela se transforme em outra coisa.

Allie e Noah: um caso claro em que amor e paixão caminham lado a lado. Reprodução/Reprodução

Um exemplo que mostra esses dois sentimentos com clareza é o filme Diário de Uma Paixão, baseado no livro de mesmo nome escrito por Nicholas Spark. Se você ainda não viu, prometemos não dar grandes spoilers, mas vamos usar o casal principal, Noah e Allie, para demonstração em alguns momentos. O relacionamento deles começa de uma forma descompromissada, como a maioria dos relacionamentos. Aos poucos, ele vai evoluindo para algo a mais. É uma paixão de Verão arrebatadora, turbulenta e, certas vezes, sofrida. É justamente assim que nos sentimos quando estamos apaixonadas, explica Alexandre. Durante esse estágio, projetamos no outro aquilo que desejamos. A pessoa pode não ser tudo o que estávamos esperando, mas, nessa fase, ela é exatamente o que queríamos, tínhamos em mente, sonhávamos. E essa coisa louca que invade nossos pensamentos e nosso coração faz a gente sentir tudo com muita intensidade. É exatamente por isso que, quando estamos apaixonadas, tomamos atitudes precipitadas, sem sentido e, vez ou outra, botamos os pés pelas mãos, sem pensar nas consequências daquele ato.

Vários estudos já foram feitos para tentar descobrir quanto tempo dura a paixão. Depende de tantos fatores que uma resposta exata nunca foi encontrada. “Algumas pesquisas empíricas sustentam que ela duraria algo em torno de seis meses”, conta o psicanalista. No entanto, há quem diga que esse estado de espírito pode durar até dois anos. Uma coisa é certa: ele não dura para sempre. E, se durar, sinal de alerta! A paixão pode ter virado obsessão, algo não tão difícil assim de acontecer. Calma, não precisa ficar assustada! Na verdade, a paixão é puramente biológica. Durante essa fase, o corpo humano produz maiores quantidades de endorfina, adrenalina, noradrenalina e dopamina. Ao mesmo tempo, diminui a produção de serotonina. Esses fatores fazem com que o nosso cérebro entenda que estamos viciadas em algo. No caso, em outra pessoa e/ou em como nos sentimos quando estamos com ela. Paixão é vício puro, é vontade, é desejo, é atração, é necessidade.

 

Depois de um tempo, esses sinais podem continuar, mas de uma maneira mais sutil. “O amor, normalmente, está relacionado a um sentimento estável e sereno. Enxergamos o outro com seus defeitos e suas virtudes, e o amamos mesmo sabendo que ele não é perfeito”, explica Alexandre Pedro, Master Practitioner de PNL filiado ao NLP Academy, Hipnoterapeuta filiado ao International Board of Hipnosys e ao National Guild of Hipnotists. Noah e Allie passam por isso quando estão mais velhos. Durante a fase do amor, os hormônios voltam a ser produzidos de maneira mais regulada. É como se o que estivéssemos sentindo virasse rotina, mas não de um jeito ruim. Afinal, quando nos acostumamos com algo, temos a tendência de nos sentirmos seguras, “em casa”. Como diz a cantora Rita Lee na música Amor e Sexo: “sexo vem dos outros e vai embora, amor vem de nós e demora(…) amor é Bossa Nova, sexo é Carnaval”. Se substituir a palavra “sexo” por “paixão”, temos uma metáfora e tanto!

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As brigas típicas de Noah e Allie mostram a tal chama da paixão, que pode ser nociva em certos momentos. Reprodução/Reprodução

Mas pode a paixão não se transformar nunca em amor? Pode. “A paixão é uma das formas para se chegar ao amor, mas não é a única”, conta o psicanalista, que completa dizendo que tudo vai depender dos objetivos de ambos. Viver um amor pode ser uma escolha, enquanto a paixão pode ser algo que acontece, nos arrebata e depois vai embora sem aviso prévio. “A paixão pode ser apenas um turbilhão de sentimentos que acaba em fagulhas. A forma como se cultiva esse sentimento faz toda diferença. Ainda acredito que o amor prefere outros caminhos menos intensos. O amor é leve, ele traz a paz que a paixão não traz. A paixão normalmente tira o sono, nos torna irracionais“, opina o doutor Alexandre.

Aliás, você sabia que, na Idade Média, a paixão era considerada uma doença para muitos? Do tipo ruim, que você deveria se blindar. Para outros, os mais romântico, contudo, era impossível viver sem ela. Muitas vezes, eles preferiam a paixão ao amor, justamente porque o primeiro estágio anestesia as pessoas e causa sensações muito parecidas com as que se sente quando se faz uso de substâncias ilícitas que causam vício. É uma coisa louca mesmo – e até perigosa, não dá para dizer que não. Se o amor não vir, é porque era algo carnal, de momento, eterno enquanto durou. Mas, na maioria das vezes, ele vem. E daí Alexandre Pedro gosta de citar Nelson Rodrigues: “todo amor é eterno. Se morreu, não era amor”.

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