“Por que é importante perguntar na entrevista de emprego se eu engravido?”

Primeiro painel do evento #SuperMeninas22 debateu raça e diversidade no mercado de trabalho, e fez questionamentos relevantes sobre nossa realidade

Por Andréa Martinelli, Isabella Otto Atualizado em 12 out 2022, 15h48 - Publicado em 12 out 2022, 15h42
Painel da Girl Up em evento
Mafo e e Julia durante painel Rebeca Figueiredo, Girl Up Brasil/Divulgação

“Eu gosto de dizer que nós, de fato, somos o futuro. Mas trabalhamos hoje para que as pessoas não deixem de entender que somos o presente e trabalhamos para conservar os b.os que gerações anteriores deixaram pra gente resolver”.

A fala acima é de Helena Branco, 20 anos, mestre de cerimônias da equipe da Girl Up Brasil, ao iniciar o evento #SuperMeninas2022, realizado em parceria com a CAPRICHO nesta quarta-feira (12), para celebrar o Dia da Menina em uma tarde de conversas para promover as habilidades de ativismo e liderança.

Mediada por Julia Reis, da Girl Up, e com as convidadas Mafoane Odara, líder de recursos humanos para América Latina na META e Cristiane Silva Pinto, gerente de estratégia de marketing das soluções do Google para micro e pequenas emrpesas no Brasil e fundadora do comitê Afrogooglers, conversaram sobre raça, diversidade e mercado de trabalho, além dos desafios que mulheres e meninas ainda enfrentam em um mundo em transformação.

Política não é só partidária. Política é sobre as escolhas que a gente faz, desde escovar o dente até a hora em que você vai dormir“, começou Odara a responder a primeira pergunta – sobre como o momento que o brasil vive hoje afeta essas relações. “A política institucional é uma delas e é muito importante. Cada uma de nos tem um dever cívico. Quando as pessoas falam que não gostam de falar de política, é difícil. Esse é o espaço de a gente tem de exercitar nossas próprias escolhas”.

Em 2022 se comemora o 10º aniversário do Dia Internacional da Menina, quando celebramos o poder, a voz e a liderança das meninas em todo o mundo. Durante as celebrações deste ano, a ONU reforça atenção em áreas que, se fortalecidas, colocará meninas adolescentes na vanguarda dos esforços de mudança, nutrindo espaços para sua inclusão na tomada de decisões. Elas estão desde o aumento ao acesso qualificado a recursos básicos, como educação, empregabilidade e serviços de saúde.

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Painel da Girl Up em evento
Cris Pinto em painel do evento da Girl Up Isabella Otto/Reprodução

Vieses inconscientes ainda existem – e nos prejudicam muito

As convidadas, ao falarem sobre mercado de trabalho, destacaram os marcadores sociais que os indivíduos carregam e que definem quem somos no mundo. “Ser uma mulher negra, de classe média baixa, me coloca em um determinado lugar social”, explica Odara. “Por que é importante perguntar pra mim em uma entrevista de emprego se eu engravido?”, questionou.

Segundo a líder de recursos humanos da Meta, ainda hoje a mente humana não acompanha a mudança que o mundo precisa. “Por isso que ainda temos pessoas que não entendem que é possível uma mudança, que mulheres e pessoas negras têm um lugar de relevância no mercado de trabalho.”

Para complementar, Cris trouxe a questão dos chamados “vieses inconscientes”, que ainda estão muito presentes tanto no universo da política ou até no mercado de trabalho. Esses vieses podem ser traduzidos como preconceitos, estereótipos ou pensamentos tendenciosos sobre determinado tema ou grupo social, que induzem a decisões prejudiciais.

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Não é normal que muheres sejam discriminadas por serem mulheres. Não é normal que pessoas negras tenham menos oportunidades por serem negras. Uma tarefa da nossa geração é garantir que a gente seja a última geração de primeiras mulheres negras em cargos de liderança”, aponta Mafo.

Tanto ela quanto Cris afirmam que a saúde mental é a base para qualquer evolução, e nossa caminhada começa desde a infância, quando fazemos nossas primeiras escolas. Além disso, há muita pressão durante a adolescência, principalmente com a chegada dos vestibulares. “Nossa geração é uma geração que vai viver muitas carreiras. Então, se pertmitir, ser flexível e ser adaptável ao ambiente é uma habilidade superimportante”, dá a dica a líder de recursos humanos, que lista ainda uma série de fatores que são importantes para você se dar bem no mercado de trabalho: “Descubra aquilo que você é muito boa – e isso não tem a ver com a profissão; aprenda a ler os códigos dos espaços que você acessa e vai acessar; encontre os seus e saiba gerir confitos”.

Cris complementa a fala da colega e salienta a importância dos investimentos. “Os homens são valorizados pelo potencial deles. Nós, mulheres negras, temos que provar 5, 10 vezes, até alguém promover ou contratar a gente. Você vê que tem pessoas qualificadas que não conseguem crescer. A gente precisa de programas qualificados e que ajudem as pessoas a crescer. Se não, a gente vai continuar a entrar nas empresas e saindo. Nós estamos apenas começando, gente. Eu sou otimista.”

Desemprego e saúde mental

O poeta e dramaturgo Ariano Suassuna diz que os otimistas são ingênuos, e que ele se considera um realista esperançoso. Mafo disse que, desde então, começou a se classificar dessa maneira também. “Nesse realismo esperançoso, é preciso dizer: o cenário não está bom para os jovens. Não é simples o momento que estamos vivendo. Então, se não tivermos espaços para manutenção mental, fica ainda mais complicado, porque a sociedade foi construída para te dizer tudo o que você não é boa. É muito ruim quando a gente fica correndo atrás daquilo que a gente não é”, alerta.

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A líder ainda retoma a discussão sobre conseguir entender os códigos dos lugares que acessamos. “O segredo do momento que a gente está é a gente aprender a ler os códigos dos lugares que a gente está. Não quer dizer que você precisa mudar, mas aprenda a ler esses códigos e se adaptar de alguma forma a eles é uma questão estratégica de sobrevivência,” garante.

Cris Pinto concorda com a fala de Mafo e diz que as coisas estão melhorando, mas ainda a passos lentos e incoerentes. “As empresas estão fazendo esforços? Sim. Mas há uma grande dificuldade de progressão de carreira para as pessoas negras, em especial para as mulheres. Tem sido muito difícil avançar. E quando vemos pessoas negras sendo contratadas para cargos de liderança, ainda é mais um jogo de cadeira, um jogo de mover as peças, que adicionar novas”, explica a fundadora do comitê Afrogooglers.

Segundo levantamento da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o Brasil é o 2º país com mais jovens fora da escola e do mercado de trabalho; e problemáticas como as levantadas pela Cris dão algumas dicas do que é possível fazer para recever aos poucos esse cenário dentro dos mundos coorporativos. “A colaboração faz de nós mais fortes”, finaliza Mafo.

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