
Para nós, jovens negros, o cabelo significa identidade
Em uma sociedade racista, a autoestima de adolescentes pretos e pardos é ameaçada o tempo todo pelo preconceito e pela falta de representatividade
m dia, uma criança negra que estava no banheiro ao meu lado arrumando seu cabelo olhou no espelho e disse que não gostava do próprio cabelo — um cabelo cacheado e volumoso. Por um momento, fiquei em silêncio. Ela logo completou, me perguntando o que eu achava dela alisar o cabelo.
Essa situação me fez refletir bastante, e eu decidi falar sobre isso no Blog da Galera de hoje: qual o significado que o cabelo tem na vida de adolescentes negros? Mas, antes, deixa eu me apresentar. Meu nome é Heloísa (ou só Helô), tenho 15 anos e moro no Rio de Janeiro.
Por mais que essa seja uma experiência pessoal minha, acredito que muitos adolescentes negros, assim como eu, sentem a necessidade de estar com o cabelo sempre arrumado — como forma de se sentirem amados e aceitos pela sociedade em que vivemos.
Em todo o continente africano, o cabelo sempre teve um significado muito importante. Sempre foi símbolo de representatividade, identidade, liberdade e linguagem — expressado através de penteados, tranças, cortes e muito mais. Quando os povos africanos foram trazidos ao Brasil para serem brutalmente escravizados, tiveram seus cabelos cortados, raspados — e, com isso, suas identidades arrancadas.
É comum que, desde a infância, pessoas negras sofram pelo fato de seus cabelos não serem parecidos com os das outras crianças. Sofrem em frente ao espelho, desejando ter outro tipo de cabelo, outro corpo, outra pele. E muitas vezes se sentem culpadas por serem quem são.
Taís Araújo, em uma de suas entrevistas no programa Conversa Vai, Conversa Vem, fala sobre os desafios de educar seus filhos: “Digo à minha filha para não deixar tocarem no cabelo dela.”
Se sentir bonito do jeito que você é já é um processo. Agora, imagine viver isso em uma sociedade onde o racismo afeta principalmente a autoestima de adolescentes que estão tentando se redescobrir e se sentir bonitos — mesmo sem referências.
Voltando à cena singular do banheiro, eu, com o meu cabelo alisado, me perguntei: tenho o direito de dizer a ela para não alisar? Mesmo assim, respondi com o coração: disse que achava ela linda como era e que talvez fosse bom repensar antes de mudar. Me vi nela.
Eu gostaria de ter ouvido isso quando era criança. Quando me olhava no espelho e me perguntava as mesmas coisas que aquela menininha. Ter alguém que dissesse que ser você mesmo e se amar podem caminhar juntos. É por isso que as referências são tão importantes. Se ver em outras pessoas é entender que existe um mundo além do padrão.
Então, a dica da semana é: olhe para o espelho e trate esse reflexo com carinho 🙂