“Aqueles 49 alunos brancos da faculdade conseguiram me intimidar”

Ana Carolina Pinheiro é colunista no 'O Nosso Lado da História' e conta suas vivências como uma jovem negra e brasileira. Primeira parada: universidade.

Por Da Redação Atualizado em 5 jun 2020, 18h42 - Publicado em 2 dez 2017, 10h16

Por Ana Carolina Pinheiro

Não sou muito pessimista, mas acho que nem nos meus sonhos mais ousados passaria pela minha cabeça ter a oportunidade de escrever para a CAPRICHO, ainda mais sobre experiências tão particulares, como a vivência como uma jovem negra e brasileira.

Na verdade, há alguns anos, eu não tinha a real noção da importância de ser representada na TV, no livro ou na revista. A vida me mostrava a todo momento que era “normal” ser rodeada por brancos e, até certo momento, eu aceitei isso. Parecia maior que eu. Mesmo vendo meus pais buscando coisas para que eu me sentisse representada, não conseguia enxergar quem eu realmente era.

Arquivo Pessoal/Reprodução

Desde o final do ensino médio até o atual momento da faculdade, comecei a dar os primeiros passos para me enxergar de uma outra maneira. Larguei mão da progressiva (às vezes, ainda uso o cabelo liso, mas vamos falar desse assunto mais pra frente), passei a respeitar mais as características do meu corpo e entrei para o coletivo negro da faculdade, um lugar cheio de descobertas e aprendizados. <3

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Com esse turbilhão de mudanças, parece até que a minha insegurança sumiu. E como em um passe de mágica, nasceu a Ana desconstruídona e livre de qualquer problema. Só que não! (risos) Todas essas novas vivências só me mostraram que a mudança estava apenas começando e que os desafios não paravam por aí. Afinal, o cabelo em transição dá trabalho, a cobrança para você ser uma pessoa “empoderada” bate na porta e a faculdade revela coisas piores do que uma média abaixo de 7 – como o racismo ainda enraizado no meio acadêmico.

Arquivo Pessoal/Reprodução

Com certeza, tudo tem o seu lado bom, mas no dia a dia dá para ver que nem sempre as coisas são flores. Quer um exemplo? A faculdade. Isso foi um mega balde de água fria que caiu na minha cabeça em 2015. Um balde necessário, mas gelado. Sempre quis estudar em um lugar onde me sentisse à vontade e não fosse vista como a “diferente” ou “a única negra”. Na real, tinha medo de sofrer preconceito. Por isso, coloquei na cabeça que algumas universidades não eram para mim. Infelizmente, a vida às vezes faz a gente pensar dessa maneira errada. Cheguei ao ponto de não fazer matrícula em uma instituição por causa dessa insegurança. Enfim, consegui passar em uma faculdade que, na minha cabeça, não sofreria tanto.

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Boom! O primeiro dia de aula no curso de Jornalismo chegou e me senti inferiorizada de um jeito que nunca tinha me sentindo antes. Até porque, no ensino médio, eu era a menina que conhecia todo mundo, que representava os alunos, organizava eventos… Uma legítima ariana, sabe? Mas, sem nenhuma agressão direta, o desconhecido me assustou. Aqueles 49 alunos brancos da faculdade conseguiram me intimidar com um padrão que eu nunca poderia me encaixar.

Precisei de um tempo para guardar a insegurança no bolso e entender que ser negra não era sinônimo de inferioridade. E que, assim como eu, outros alunos negros também deveriam estar ali, se sentindo da mesma forma. Até porque, não existe essa coisa de “isso não é pra gente”. Esse espaço que estou escrevendo é pra gente. A cadeira da faculdade é pra gente. A chance de se amar e ser amada é pra gente. Tudo é pra gente! Mesmo que, na prática, as coisas ainda não funcionem dessa maneira.

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Acho que esse é o recado principal que quero passar com este meu primeiro texto na coluna “O Nosso Lado da História”. Contei um pouco sobre a minha vida, mas também quero ouvir as experiências, dores e alegrias de vocês. Por isso, fiquem à vontade para comentar ou mandar um e-mail para anacarolipa16@gmail.com. Afinal, juntas somos mais fortes!

Beijos,
Ana Carolina Pinheiro

 

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