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Conheça o grupo feminista que salva mulheres durante o expurgo

O seriado The Purge estreou na TV americana em setembro e faz uma dura crítica ao feminicídio.

Por Isabella Otto Atualizado em 20 out 2018, 10h00 - Publicado em 20 out 2018, 10h00

Expugar: o mesmo que purgar, limpar, eliminar a sujeira, tornar limpo. É desse verbo que vem a palavra expurgo, que é o ato de expurgar algo. O termo foi usado por alguns norte-americanos para criar uma série de filmes bastante famosa, conhecida como The Purge, ou, no Brasil, Uma Noite de Crime. A história se passa em um futuro não tão distante em que o Governo americano institui um feriado conhecido como “noite do expurgo”. Nessa data, as pessoas têm liberdade para usar armas até nível quatro para matar quem quer que seja em um período de 12h sem que o ato seja passível de condenação. A franquia faz uma dura crítica à indústria armamentista dos Estados Unidos, à essência do ser humano e à desigualdade social. Recentemente, os filmes ganharam um seriado, também chamado The Purge. “Bendita seja a América, uma nação renascida” é o lema de quem expurga.

Madelyn, à esquerda, falando sobre o feminicídio que acontece durante o expurgo para Jane, à direita. Reprodução/Reprodução

Na primeira temporada, várias histórias são retratadas, como acontece nos filmes da franquia. Mais uma vez, é feita a crítica de que os mais ricos continuam levando a melhor durante o expurgo enquanto os pobres só se ferram. A trama também mostra como pessoas tidas como boas podem acabar se corrompendo por questões triviais do dia a dia, como uma promoção de emprego, em um impulso de deixar o instinto animalesco de sobrevivência falar mais alto. Mas o ponto alto dos primeiros 5 episódios (a série tem 10, no total) acontece quando o público conhece as Santa Matronas, um grupo feminista que se expõe durante a noite do expurgo para salvar mulheres.

Madelyn (Sabrina Gennarino), uma das líderes do grupo, é a grande responsável por salvar Jane (Amanda Warren) de ser abusada sexualmente por uma cara que a aborda na rua. Sim, estupros também estão liberados durante o feriado. Na sequência, a “santa matrona” fala algo bastante interessante: “para muitos homens, hoje é um passe livre para machucar mulheres. A cada expurgo, três mulheres são mortas para cada homem”. O trecho faz uma dura crítica ao feminicídio e à sociedade patriarcal a qual pertencemos, já que visivelmente as pessoas do sexo masculino continuam levando a melhor durante o expurgo.

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O fato de muitos rapazes, de desconhecidos a familiares, usarem a data para saciarem seu desejo mais brutal, animalesco e objetificador de usar uma garota para satisfazer seu próprio prazer, sem o consentimento dela, também é usado como um forma de questionamento e crítica. No expurgo, não dá para confiar nem mesmo nas pessoas mais próximas. Será, então, que aquele ficante/namorado/marido só precisa de um aval para cometer um crime do qual não vai ser punido depois?

O grupo feminista funciona como uma extensão da realidade. Cansadas de ver mulheres sendo mortas por questões de gênero, premissa básica do feminicídio, as integrantes do Santa Matronas usam uma data essencialmente ruim para combater o mal e fazer o bem. Na verdade, é difícil bater o martelo e dizer que a noite do expurgo tem raízes na maldade. Tanto no seriado quanto nos filmes, muitos cidadãos americanos defendem o programa sancionado pelo Governo e expurgam achando que estão fazendo algo positivo pela e para a humanidade. Mais uma vez, é importante ressaltar que mulheres, negros, imigrantes, pessoas de classes sociais mais baixas e homossexuais são sempre as maiores vítimas. Quantos, então, que se aproveitam do expurgo para torturar e matar em massa não acreditam no dia a dia que essa “limpeza” deveria mesmo ser feita? Quantos não se aproveitam do expurgo, aprovado por lei pelo presidente, para colocar em prática seus discursos e suas ações racistas, homofóbicas, machistas e totalitárias?

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O expurgo é principalmente sobre supremacia. Enquanto ricos têm dinheiro para blindar suas casas, contratar seguranças e comprar pessoas para expurgarem por diversão, pobres têm as casas facilmente invadidas, são capturados e colocados à venda em leilões. As ativistas do Santa Matronas recebem pedidos de ajuda de mulheres que são abordadas nas ruas ou em suas próprias casas por estranhos, mas quantas outras não estão sendo estupradas pelos maridos e acreditam que não podem fazer nada, porque é um direito deles? Afinal, é a noite do expurgo!

O seriado produzido por James DeMonaco está cheio de críticas, que vão desde as mais escancaradas até aquelas camufladas nas entrelinhas, mas definitivamente a produção acertou ao falar sobre feminicídio e dar destaque a um grupo feminista que salva mulheres, expõe abusadores e retrata tão fielmente nossa realidade.

Existe sororidade durante a noite do expurgo – ou será que para nós, mulheres, o expurgo acontece todos os dia e não apenas na ficção?

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