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7 vezes em que a 3ª temporada de Sex Education cutucou os conservadores

A nova temporada da série é uma delícia de assistir, muito porque dá várias indiretas bem diretas ao conservadorismo tóxico

Por Isabella Otto Atualizado em 26 set 2021, 12h46 - Publicado em 25 set 2021, 10h04

A 3ª temporada de Sex Education, da Netflix, entrega mais uma vez absolutamente tudo – mas, desta vez, algumas cutucadas no conservadorismo ficam mais do que evidentes! E são também mais do que bem-vindas, uma vez que vivemos uma onda conservadora muito intensa, que sociólogos e filósofos acreditam que não irá sobreviver ao século 21, mas que segue fazendo vítimas no mundo todo.

A seguir, listamos algumas dessas afrontas aos conservadores de plantão e seus típicos pensamentos ultrapassados e retrógrados. Será que você tinha reparada em todas elas?

Jean Milburn, de Sex Education, sentada na sala de espera do hospital, sozinha, enquanto espera pra fazer um ultrassom
Jean Milburn na sala de espera do hospital, antes de entrar no polêmico ultrassom Sam Taylor/Netflix

1. O tabu da gravidez da mulher mais velha

Na reta final da gestação, Jean Milburn (Gillian Anderson) é destratada por um médico durante o ultrassom. Ele se mostra contrário à gravidez da mãe do Otis (Asa Butterfield), que já é uma mulher na faixa dos 45 anos. Ao falar que não quer saber o sexo do bebê, o médico diz: “Assim como muitas mães mais velhas. Preferem se concentrar em completar a gravidez em segurança”. Ela diz que está ciente dos riscos e que fazem questão de lembrá-la deles todos os dias. E especialista diz que ter pais idosos pode afetar negativamente a vida da criança, ao que Jean rebate: “Não acha que ter um pai escroto também pode afetar negativamente a vida das crianças?”. Revoltada com o tratamento e os comentários ageístas que recebeu, a terapeuta procura o superior do médico, que é quase uma xérox dele: um homem branco, heterossexual, de meia idade. “Ah, fantástico. Mais um”, comenta com desdém. O mesmo recorte vale para o responsável pela Moordale High School, que dita as normas para a nova diretora. No caso, o conservadorismo é representado pelo pelo papel do homem branco, engravatado e rico, que ocupa ainda a maioria dos locais de poder, como no Congresso, ditando normas para um todo baseando-se em posicionamentos que pararam no tempo – e tendem a ser bastante preconceituosos.

2. O relacionamento de mulheres com homens mais novos

Jean Milburn acaba cruzando com um ex-affair, que é mais jovem que ela, na saída do hospital. Nessa hora, Jakob (Mikael Persbrandt) está junto e comenta sobre a idade do rapaz. “Você dormia com aquele homem? Ele é muito mais jovem que você”, questiona. Jean responde: “Eu dormia com muitos homens e alguns eram mais novos, sim(…) Eu já fiz muito sexo casual na vida, e não posso mudar isso. E nem gostaria”. Nossa sociedade tende a fazer vista grossa para homens que se relacionam com mulheres mais novas – em alguns casos, bem mais novas -, mas, ao ver uma mulher mais velha namorando uma pessoa mais jovem, na primeira oportunidade, já faz críticas e julgamentos.

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3. A resistência contra a linguagem neutra

O debate atual sobre a linguagem neutra ganhou destaque na 3ª temporada, protagonizado especialmente por Cal, estudante não-binárie da Moordale que trava uma batalha contra a nova diretora, Hope (Jemima Kirke), que não só é bastante conservadora em seus posicionamentos profissionais como se nega a aceitar diferentes realidades, como a de pessoas queer. Em diversos momentos, ela deixa claro que acha que Cal é apenas confuse ou que tenta aparecer. Ela se baseia estritamente na biologia para compreender questões envolvendo identidade de gênero, pensa no masculino e feminino, e ignora completamente as outras existências, muitas vezes impondo sua verdade. É interessante destacar que Cal é interpretade por Dua Saleh, rapper de ascendência sudanesa que se identifica como uma pessoa não-binária na vida real e garante que o que a série está fazendo é revolucionário!

Vivi, Cal e Jackson, de Sex Education, conversam em frente a uma parede pichada
Viv, Cal e Jackson em frente ao histórico mural de pênis da escola Sam Taylor/Netflix

4. A homofobia como crime

Em diversas parte do globo, a homossexualidade é ainda criminalizada, como na Nigéria, onde a lei proíbe o casamento gay, as relações amorosas entre pessoas do mesmo sexo e a adesão a grupos de direitos LGBT. A pena pode chegar a 14 anos de prisão, além de perseguição. Em 2019, inclusive, 47 homens foram acusados pelo crime de homofobia, na região de Lagos, a mesma em que Eric Effiong (Ncuti Gatwa) vai para a balada com o fotógrafo do casamento da família. Na cena em que estão prestes a entrar na festa, o novo amigo diz que sumiu rapidinho para ver se o local tinha rotas de fuga, evidenciando a perseguição à comunidade LGBTQIA+ no país.

+: Você sabe o que significa a sigla LGBTQIA+?

Lily, de Sex Education, está sentada no palco do teatro da escola, na frente de todos os alunos, usando no pescoço uma placa da vergonha, dizendo que ele escreve coisas nojentas
Alerta de bullying e abuso de poder: Lily com a placa da vergonha, dada pela diretora Hope, em que diz que ela escreve em suas histórias sobre Ets palavras sujas e nojentas, que envergonham os colegas Sam Taylor/Netflix

5. A educação sexual como sinônimo de perversão

Hope recebe toda uma pressão do superior para transformar a imagem da Moordale, mas ela por si só já se mostra bastante contrária à disciplina de educação sexual na escola. Para ela, a saída é assustador os jovens, mostrar como o sexo pode ser perigoso, incentivar a abstinência sexual e botar todo o peso e culpa de uma gravidez indesejada em cima da mulher. Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência… Em janeiro de 2020, por exemplo, Damares Alves, ministra da Família, da Mulher e dos Direitos Humanos, divulgou que um de seus planos de governo era o projeto que promovia a abstinência entre jovens, em parceria com Nelson Neto Júnero, criador do movimento “Eu Escolhi Esperar”, que incentiva jovens a fazerem sexo apenas depois do casamento. Sem contar todas as fake news já espalhadas pelo governo Bolsonaro sobre a Caderneta do Adolescente, disponibilizada gratuitamente pelo Ministério da Saúde, e seu ~incentivo ao sexo e à comunidade LGBTQIA+~. Na verdade, tudo é uma tentativa de politizar um discurso em prol de ideias de uma extrema direita caracterizada pelo conservadorismo. Além disso, estudos mostram que nenhum projeto pautado em cima da abstinência sexual para reduzir o índice de gravidez na adolescência foi promissor. “Todos os programas que focaram ou tentaram falar de comportamentos não deram certo. Uma revisão feita no Reino Unido em 2016 mostrou que políticas baseadas em tentativas de mudanças de comportamento não têm aderência dos jovens. A gravidez na adolescência é um composto de situações e as populações vulneráveis têm que ser pensadas”, disse Albertina Duarte Takiuti, Coordenadora do Programa Saúde do Adolescente da Secretaria da Saúde do Estado de SP, em entrevista ao jornal da USP no Ar.

6. Os homens que não podem demonstrar as emoções

A mulher é a mais afetada pelo machismo estrutural, mas os homens também colhem os frutos negativos. “Homem não chora”, “homem de que ser pegador”, “homem pode se masturbar à vontade”, “homem não tem controle sob seus instintos sexuais”… Todas essas frases compactuam com a masculinidade tóxica, geram pressão e ajudam a construir homens escrotos. O Adam Groff e seu pai, o Michael, são vítimas dessa sociedade – o que não justifica os muitos erros que eles já cometerem, que fique claro! Muitas vezes, eles escondem sua fragilidade, que pode vir a ser bastante positiva, atrás de uma casa difícil de penetrar, dura, agressiva e tóxica para eles e para os que estão ao redor. Quando conseguem enfim se libertar minimamente dela, se tornam pessoas muito melhores e mais mentalmente saudáveis. Fica aí mais essa crítica à realidade em que estamos inseridos e ajudamos a moldar diariamente.

+: Complexo de Gaston explica a masculinidade frágil de muito homem por aí

A aluna Viv e a diretora Hope, de Sex Education, conservam no meio do corredor da escola
Hope tenta convencer Viv a fazer o que ela manda, enquanto, na realidade, só quer usar a aluna e sua aparência para ficar bem com os investidores e disfarçar Moordale de uma “escola progressista” Sam Taylor/Netflix

7. O novo que na verdade é mais do mesmo

Quantas vezes figuras já não aparecem fazendo promessas de um mundo novo? Algumas, inclusive, bem problemáticas. Muita gente cai no conto do vigário, ou seja, na história inventada, já que, se olharmos bem, a pessoa reproduz padrões antigos, normalmente ultrapassados, pautados em cima do populismo. Ah, o perigo que mora aí… Não se deixe enganar! Às vezes, o novo, como a Hope, brilha aos olhos num primeiro momento, mas é só pra ludibriar. Atrás desse novo tem o “velho”, que só escolheu esse novo porque ele justamente acredita no antigo. E, na maioria das vezes, não tem como fugir: o conservadorismo é baseado em ideias preconceituosas, que hoje não fazem mais sentido em meio a tantas discussões que estamos tendo. Por isso, atenção: conservadores podem adorar espalhar notícias falsas por aí para “provar” seus pontos e estimular o efeito manada. A liberdade de expressão garante que cada um faça as suas escolhas, mas lembre-se de que a sua liberdade termina onde começa a do outro – e que nenhuma liberdade de expressão justifica atos e falas criminosas.

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