Black Mirror é o tipo de série que traz tramas tão surpreendentes e impactantes que, em quase todo final de episódio, sua principal (e talvez única?) reação é pensar: “O que acaba de acontecer aqui?”. Acontece que, às vezes, a vida imita a arte de um jeito ainda mais chocante. Enquanto o ator Will Poulter gravava o especial interativo, Black Mirror: Bandersnatch, certamente a última coisa que poderia passar pela mente dele seria que, pouco mais de uma semana após a estreia, ele teria que se afastar das redes sociais para preservar sua saúde mental. O motivo? Muitas pessoas assistiam ao filme e tinham apenas um comentário sobre o ator: ele era feio.
No dia 2 de janeiro, Will publicou um texto de despedida em sua conta no Twitter e anunciou que se afastaria das redes sociais. Embora não tenha deixado claro o real motivo por trás da saída, o afastamento do ator coincide com o mesmo período em que tweets e comentários sobre sua aparência circulavam na internet.
“Diante das minhas experiências recentes, escolhi me afastar do Twitter. Antes de fazer isso, gostaria de agradecer sinceramente a todos os que assistiram a ‘Bandersnatch‘ e demonstraram suas reações (independentemente de quais elas foram) ao conteúdo que criamos. Aceito todas as críticas e é um prazer ver como muitos de vocês aproveitam o que tantas pessoas trabalharam duramente para produzir”, o ator começa o texto.
Will, então, menciona o perigo das redes sociais: “Como todos sabemos, há um equilíbrio a ser encontrado em nossos envolvimentos com redes sociais”. “Tem coisas positivas a serem aproveitadas e, inevitavelmente, negativas, que é melhor evitarmos. Esse é um equilíbrio que eu tenho lutado para encontrar faz um tempo e, priorizando minha saúde mental, sinto que chegou a hora de mudar minha relação com as redes sociais“.
O ator encerra o texto afirmando que não deseja parecer ingrato com todo o apoio que tem recebido ou que seu desligamento envolva qualquer uma das organizações que trabalha. “Sou privilegiado por ter essa plataforma. Espero que esta pausa possa reduzir minha expressão pessoal e aumentar o foco em questões que importam, resultando no melhor para todos“, conclui. No Instagram, a última publicação de Will é de junho de 2018.
Além de ter participado do especial interativo de Black Mirror, Will Poulter também já estrelou sucessos como As Crônicas de Nárnia e Maze Runner. Aos 25 anos, o ator é um grande ativista em campanhas contra o bullying e embaixador de organizações e projetos anti-bullying, que apoiam jovens talentos, entre outros temas. Com um currículo desse, a pergunta que fica é: uma pessoa assim merecia ter que se afastar da internet para preservar sua saúde mental diante de tantas críticas sobre sua aparência? Não, ninguém merece isso. E menos ainda alguém que se utiliza de tantos recursos para lutar contra o bullying.
Embora as discussões sobre depressão, empatia e autoestima tenham crescido consideravelmente nos últimos anos, esses acontecimentos servem para nos mostrar como os seres humanos ainda são seletivos por conta de aparência. O personagem de Will em Black Mirror não é cruel com ninguém e não tem o menor motivo para ser odiado pelo público – e mesmo se tivesse, é preciso saber separar as coisas, né? Contudo, no mesmo mês que o ator abandonou as redes sociais, várias pessoas relataram estar “apaixonadas” ou até entenderem as atitudes de Joe, da série Você, interpretado por Penn Badgley.
Nada disso teria o menor problema se Joe não fosse um personagem psicopata que persegue uma mulher durante a série inteira. Entender as atitudes ou romantizar as ações dele é algo tão preocupante que o próprio ator teve que pedir que os fãs não concordassem com o protagonista. Mas, como não podemos negar que Penn é um ator considerado bonito pelo público, será que a mesma coisa aconteceria se Will interpretasse o psicopata Joe?
Os comentários sobre a aparência de Will não podem ser desfeitos e ele provavelmente demorará um tempo para reativar suas redes sociais, porém as pessoas que os fizeram podem aprender um pouco com esse triste acontecimento. Pode ser clichê de mãe, mas não existe nada mais real do aquele velho ditado: não faça (ou fale) com os outros o que você não gostaria que fizessem com você. A empatia não pode ficar apenas nos textos de Facebook no mês de setembro. Combinado?