Nesta quarta-feira (29), estreia “A Magia de Aruna”, no Disney+. Na série ambientada em um Rio de Janeiro cinzento, por conta de uma crise solar, conheceremos Mima, uma adolescente que faz o que pode para esconder ser misterioso dom. Sem mais spoilers, quem está por trás do roteiro dessa história é Maíra Oliveira – a primeira mulher negra a assinar criação da Disney Brasil.
Maíra é uma contadora de histórias versátil com formação em Educação, Literatura, Audiovisual e Teatro, que está deixando uma marca na indústria do entretenimento com sua abordagem única no desenvolvimento de narrativas, enfatizando a representação positiva de pessoas negras, mulheres e LGBTQIAP+.
“Longe de defender que sou precursora, preta no topo ou qualquer coisa desse tipo, pois reconheço o trabalho das muitas e muitos que vieram antes, que estão ao meu lado e que ainda vão chegar”, diz em entrevista a esta coluna.
Como Maíra chegou até a “Magia de Aruna”
O primeiro filme que Maíra escreveu e dirigiu foi um curta-metragem chamado Encruza. “Ele foi feito em um processo formativo com muitos amigos que, assim como eu, estavam aprendendo a arte e o ofício de fazer cinema. Foi muito intenso e dolorido também, pois foi nesse momento que precisei aprender a negociar ideias e entender muito rapidamente que cinema é coletivo e que o caminho, idealmente, é o do meio”, conta.
E continua: “Senti que precisava me conhecer profundamente, saber o que para mim era inegociável e outras coisas que poderia abrir mão, para que o projeto fosse realizado. E entendi também que autoria, nem sempre é sobre ter a ideia, seguir com ela imutável até o final, mas é sobre fazer sua voz valer dentro da criação e se reconhecer ao fim”. Deu certo, Encruza ( foi eleito melhor Filme Júri Popular no II AFRONTE – FESTIVAL DE CINEMA LGBTQIAP+.
A partir disso, Maíra construiu sua jornada no mundo das histórias, por meio de notáveis contribuições criativas de impacto em várias plataformas, que inclui projetos de alto perfil com as principais produtoras do país para plataformas e canais de grande proeminência.
Na Netflix, ela foi roteirista no longa-metragem de comédia “Ricos de Amor 2,” criado por Bruno Garotti e Sylvio Gonçalves, produzido pela Ananã. No Amazon Prime Video, escreveu o longa-metragem de comédia “Papai é Pop” com Lázaro Ramos e Paolla Oliveira, dirigido por Caito Ortiz, produzido pela Pródigo, que foi indicado ao Grande Prêmio de Cinema Brasileiro, na categoria melhor filme de comédia.
E não para por aí. Na Rede Globo, contribuiu para o desenvolvimento inicial da série biográfica “Marielle” para a Globoplay, além de ter escrito campanhas institucionais e sido curadora do LANANI, laboratório de narrativas negras e indígenas e parceria com a FLUP. Já na Futura, foi roteirista da multipremiada série de variedades e infantil “Quintal TV”, produzida pela Delicatessen.
Nem tudo são flores, mas vamos tirando os espinhos
Apesar do sucesso, sabemos da dificuldade das mulheres negras em todas as áreas de atuação no mercado de trabalho – em especial, no audiovisual. Maíra diz que se sente em eterna disputa e muitas vezes sozinha. “Percebo que existem ainda mecanismos de isolamento da minha voz, da voz de pessoas como eu. Muitas vezes sou a única mulher, a única pessoa preta e a única pessoa LGBTQIAP+ na minha equipe”, diz Maíra.
Eu, como uma mulher negra, entendo muito bem ela. Ocupar lugares em que somos “exceções” faz de nós representante de muitas pautas e isso não é fácil.
“É violento ocupar um lugar que não reconhece que eu, sendo humana, erro, não trago verdade absolutas e tenho uma visão parcial. Como estou sozinha, preciso estar em constante vigilância ao mesmo tempo que preciso me manter criativa e saber duas vezes mais”, desabafa a roteirista, que também reconhece o privilégio de viver o sonho de suas ancestrais e destaca o desejo de que o cenário do audiovisual se torne mais saudável para outras contadoras de histórias como ela.
Enfrentando essas barreiras, Maíra também ganhou seu lugar no teatro, com as peças “Yaba: Mulheres Negras” e “Duas Fridas” – ambas em cartaz em 2019. Na literatura, escreveu livros infantis, como Mari, a Sementinha” (2018) e “Que Saudade da Minha Vó!” (2020); os contos “Respirar: A Emergência é Essa” (2020) e Ed. Malê, 2018, a biografia “Narrativas Negras” (2020) e fez poesia em “Favela em Mim” (2019). Além de tudo isso, ela compartilha seu conhecimento como professora em cursos e projetos. Incrível, né?
Maíra é definitivamente uma inspiração. Sua jornada nos abre portas inimagináveis e, com certeza, facilita a caminhada de outras meninas pretas que sonham em ser autoras e roteiristas.