Continua após publicidade
Continua após publicidade

Para Betina Polaroid, se montar (e virar meme) é um ‘grito de liberdade’

Ela tem uma trajetória que vai do insight de montar uma drag fotógrafa até 'pagar calcinha' e virar meme a nível nacional em Drag Race Brasil.

Por Arthur Ferreira Atualizado em 29 out 2024, 18h08 - Publicado em 14 nov 2023, 12h10

A primeira temporada de Drag Race Brasil já está chegando ao fim e nós já estamos com saudades dos memes de Betina Polaroid! Muito mais do que nos convidar para o seu estúdio, Betina nos mostrou uma verdadeira história de evolução ao longo dos episódios. Chegando forte na reta final do reality, a drag contou com exclusividade à CAPRICHO como se sentiu ao viralizar nas redes sociais.

“Eu já sabia da minha trajetória e que o meu percurso ao longo da competição foi de um passo a cada vez, mas não imaginei que isso fosse viralizar”, revelou.

Desde seus primeiros passos frequentando boates LGBT na juventude, Betina teve seus primeiros contatos com a arte drag aos 20 anos, quando começou a sair para a noite. Foi com a chegada do Rupaul’s Drag Race em sua vida, 20 anos depois, que ela começou a buscar mais sobre a nova cena drag do Rio de Janeiro, vinte anos.

Esse encontro não só despertou seu interesse em criar sua própria persona drag, mas também a levou a reconhecer a cena como um espelho para suas próprias questões de expressão de gênero, proporcionando uma oportunidade de vivenciar algo que ela sentia ter sido reprimido durante sua juventude.

“E aí veio o insight: não preciso ir para frente das câmeras e largar a fotografia, eu posso ser uma drag queen fotógrafa e sair montada para fotografar”, contou.

Continua após a publicidade

View this post on Instagram

A post shared by Betina Polaroid 📸 (@betinapolaroid)

Betina teve um começo um pouco turbulento no reality e logo no primeiro episódio ela precisou dublar por sua sobrevivência. Depois disso, a drag começou a adotar todas as dicas que os jurados davam de feedback e deslanchou na competição. “Eu fui a zebra, né? Ninguém esperava que eu fosse chegar forte no final, mas eu fui crescendo por prestar atenção nos comentários dos jurados, que me ajudavam a dar uma direção”.

Ao abordar os memes que a destacaram, Betina falou sobre a origem da situação icônica que fez sua calcinha viralizar nas redes sociais. Ela revelou ter ficado muito irritada no primeiro momento em que Dudu Bertholini reclamou da sua calcinha. Mas logo depois isso virou piada interna e ela levou isso na boa, assim como as piadas sobre a sua voz rouca.

Aliás, as coincidências fazem muito parte de sua trajetória: antes mesmo de revelar sua escolha para o Snatch Game, o público já associava a voz de Betina a influenciadora Regina Rouca. Além disso, toda a história do “vem para o estúdio da Betina Polaroid” ainda casou com os planos futuros da drag, que pretende voltar com seu projeto de colaborar com artistas em seu estúdio de fotos.

Sobre a possibilidade de vencer a competição, Betina revelou que traria uma mistura de sentimentos, desde a euforia da realização até o receio da responsabilidade que vem com o título de primeira vencedora da franquia. “Para mim, representaria assumir a responsabilidade de construir um legado e de ser a porta-voz dessa primeira geração de Rugirls brasileiras”, compartilhou.

Continua após a publicidade

Leia a entrevista completa:

CAPRICHO: Como a arte drag surgiu para você?

Betina Polaroid: Quando eu era bem jovem, eu já frequentava algumas casas noturnas com shows de drag. Eu já conhecia um pouco da arte drag da cena do Rio de Janeiro e Niterói na época que eu comecei a sair para as boates LGBT – na época GLS [risos].  Eu também trabalhei em uma revista que chamava Sui Generis, que foi a primeira revista de conteúdo específico para a comunidade de circulação nacional, e fazia cobertura de eventos. Foi assim que eu fui conhecendo a arte drag porque na época a gente não via drag queens em espaços midiáticos, era mais no presencial, nas boates.

Eu já tinha um interesse em criar a minha drag, mas isso ficou um pouco distante de mim. O que mudou foi a chegada de Rupaul’s Drag Race na minha vida. Comecei a assistir todas as temporadas e fiquei obcecado pelo reality e pelas drags. A partir daí eu comecei a procurar o que rolava na cena drag da cidade e descobri que ela estava crescendo e se renovando. Eu percebi que, na verdade, aquelas pessoas estavam sendo um espelho para mim. Eu estava apontando a câmera para onde eu me via.

Eu percebi que, na verdade, aquelas pessoas estavam sendo um espelho para mim. Eu estava reconhecendo as minhas questões de expressão de gênero e esse fascínio. Eu estava apontando a câmera para onde eu me via. 

Betina Polaroid
Continua após a publicidade

Eu percebi que mesmo depois de adulto, ainda tinha algo reprimido relacionado a poder me expressar sem essa carcaça de uma de uma expressão masculina que foi forjada para dar conta das cobranças. E aí quando eu vi essa essa galera se montando, se jogando na noite e fazendo arte, isso foi para mim uma oportunidade de viver algo que eu não tive quando era jovem.

E aí veio o insight: não preciso ir para frente das câmeras e largar a fotografia, eu posso ser uma drag queen fotógrafa e sair montada para fotografar. 

Fazer drag é ‘sair do armário’ pela segunda vez?

Quando a gente começa a se montar, a gente está questionando um padrão de gênero e de comportamento, desafiando uma norma que impõe que a gente se comporte dentro de um padrão heteronormativo. É aquele conservadorismo mascarado de aceitação do tipo, ‘ah, você pode ser gay, mas o que você faz entre quatro paredes ninguém precisa saber’. É um grito de liberdade. A gente se liberta dessas formatações sociais.

Continua após a publicidade

Em drag race, você contou que tem TDH e transtornos de processamentos sensoriais. Como é ter esse experiência sendo drag queen?

Às vezes um cílio, um corset apertando, incomoda muito. Se para qualquer drag é muito incômodo, para quem tem um transtorno sensorial, às vezes amplifica mais ainda essas sensações de dor. Sabe, aquele look que eu usei no Glitter Glam que é todo de espelhinhos de acrílico, toda vez que eu dobro no cotovelo ou no joelho, aquilo espeta muito. Eu até coloco proteção nas dobras, mas mesmo assim. Claro que eu limito um pouco os meus movimentos na performance com essa roupa para evitar que eu me machuque, mas na adrenalina do palco, você não sente né?  

Outra dificuldade é na comédia porque drag tem que ser rápida na resposta, né? E às vezes dá um delay de processamento da informação. Eu acabo tentando me divertir e fazer piada com relação a isso, mas a gente sabe que é um assunto sério e um debate muito atual.

Como foi o processo seletivo e qual foi sua reação ao descobrir que foi selecionada para o programa?

Fiz a inscrição sem a menor esperança de ser selecionado, mas muito pilhado pelo meu marido e pelos amigos. Quando eu recebi a chamada dizendo que eu estava selecionada, eu fiquei em choque. Eu recebi uma mensagem no WhatsApp: “Betina, eu preciso falar com você, hoje”, e eu super atrasada perguntei se era coisa rápida. E isso achando que eu já estava fora do processo, porque já tinha se passado muito tempo. Eu atendi o telefone e me falaram que eu estava selecionada. Eu fiquei mudo olhando para tela, fiquei muito impactado.

Continua após a publicidade

Você chegou na competição e logo no primeiro episódio foi parar no bottom e precisou dublar. Como foi a sensação?

Nossa, foi muito assustador e inesperado para mim. Eu tinha criado na minha cabeça uma fantasia de que não haveria eliminação, eu imaginei que seria uma disputa pelo primeiro broche. Como eram dois grupos que ainda não tinham se encontrado, eu imaginei que eles manteriam as 12 juntas para ter um episódio com todas juntas. Não imaginei que haveria uma eliminação naquele momento.

Ao mesmo tempo, a Gretchen foi a nossa jurada do primeiro episódio. Então na minha cabeça a música ia ser a da Gretchen, porque tinha uma música dela no repertório de músicas que a gente tem que aprender para dublar. E não foi, né? Na hora foi tudo ao contrário, uma batalha pela sobrevivência com uma música que eu não tinha me preparado.

Eu suei tanto nas pernas que meu sapato estava escorregando no pé assim. Eu estava com medo de virar o pé, porque a meia estava úmida e deslizando dentro do sapato. Todas as inseguranças vieram na cabeça e, ao mesmo tempo, era o medo de ser a primeira eliminada. Foi uma situação de muito pânico.

Logo no primeiro episódio você protagonizou dois dos grande memes da temporada, que foi Dudu Bertholini implicando com a sua calcinha e a famosa frase “vem pro estúdio da Betina Polaroid”. Foi um momento negativo, mas que repercutiu de forma positiva.

Dudu Bertholini me deu esse presente do meme da calcinha! [risos]. Mas no primeiro momento que Dudu reclamou da minha calcinha, fiquei muito irritada. Porque, na verdade, ele estava apontando para um viés no meu maiô que era branco e que ele achou que era uma calcinha vazando. É claro que se aquilo estava imprimindo calcinha, é um problema do figurino, mas não era uma calcinha e eu nunca entraria pagando calcinha daquele jeito. Depois quando ele apontou isso de novo foi na passarela da Top Model, e aí realmente a calcinha vazou na hora que eu fui dar uma jogada de pernas assim. E aí isso virou piada interna ali e depois viralizou para o Brasil inteiro. 

Outro meme que surgiu foi o “Betina Polaroid não para de subir nas pesquisas”. Como você vê sua trajetória na competição?

Esse foi o mais surpreendente para mim. Eu já sabia da minha trajetória e que o meu percurso ao longo da competição foi de um passo a cada vez, mas não imaginei que esse fato fosse viralizar. 

No primeiro dia que eu fiquei entre as melhores eu comecei a entender que eu podia chegar na final. Eu fui a zebra, né? Ninguém esperava que eu fosse chegar forte no final, mas eu  fui crescendo por prestar atenção nos comentários dos jurados, que me ajudavam a dar uma direção. Eu fui confiando nisso, e entrando nesse estado de não querer mais dublar e ir subindo cada vez mais sabe.

View this post on Instagram

A post shared by @shantayficagay 🇧🇷 (@shantayficagay)

Qual foi seu momento favorito da competição? 

Foi o episódio 9, o episódio do roast. Ao mesmo tempo em que eu fui vitoriosa nesse dia, desfilando com o meu look favorito de todos os que eu levei, também tive a oportunidade ver aquele double shantay lindo. Eu até me arrepiei agora só de falar, porque foi um momento muito bonito ver o que a Organzza e a Shannon Skarlett fizeram ali. Foi um momento de plenitude.

E qual foi o seu momento mais difícil?

Foram alguns, muitas crises de ansiedade (risos). Estar confinado, longe da família e sem poder pegar o celular e ligar para alguém foi muito difícil. Por isso que eu falo que foi tão importante ter uma relação de irmandade com as outras competidoras. A gente só tinha nós mesmos para nos apoiar, não tinha mais ninguém para desabafar.

Eu tinha dificuldade de manter o foco com o ritmo da competição muito forte. Eu tinha que estar alerta e ser criativo todos os dias e a cobrança é constante o tempo inteiro. Não dava tempo de respirar, é uma corrida mesmo. Então às vezes eu me sentia muito exausto mentalmente e emocionalmente. 

Teve um momento em especial, no dia do desafio de costura da sereia. Para mim foi o desafio mais difícil porque eu tinha vindo de dois episódios com destaques negativos e eu estava muito insegura. Eu estava com muito medo de dublar e não queria cair naquela situação de novo. 

Se você pudesse roubar um look de alguma concorrente na competição. Qual você usaria? 

Tiveram vários looks  icônicos e maravilhosos. Um que eu usaria definitivamente usaria seria o de cobra da Organzza, na passarela da Amazônia. Os olhos daquela cobra estavam vivos para mim assim, toda vez que eu via ela nos bastidores eu tomava susto.

O que significaria para você ganhar a primeira temporada de Drag Race Brasil?

Para mim seria uma grande surpresa. Fazer drag coloca a gente diante de muitos gatilhos que a gente precisa superar e isso traz ansiedade. Para qualquer artista, a arte não vem sem sofrimento. A gente coloca quilos de maquiagem para se mostrar o mais transparente possível, então é uma exposição muito grande. Toda vez que eu penso na possibilidade de vencer me vem uma mistura de sentimentos. Uma euforia de realização e de conquista e ao mesmo tempo o medo da responsabilidade.

Para mim, representaria assumir a responsabilidade de construir um legado e de ser a porta voz dessa primeira geração Rugirls brasileiras. A minha experiência pessoal no Drag Race foi uma de superar meus medos. A coragem não é ir sem medo, é ter medo e ir com ele. Se você não tem medo, você não precisa ser corajoso. A coragem é você ir com medo e não desistir, e eu quis desistir muitas vezes.

Qual conselho você daria para uma nova geração de ‘drags’?

Meu conselho mais honesto é: confia e vai! Acredita no seu valor. Você não precisa que alguém te diga o quanto você é bom. Não vá para o Drag Race Brasil para provar isso para os jurados ou provar isso para o público, mas sim para entregar aquilo que você já sabe que você tem. Confia no que você tem de melhor e entrega, porque o resto vai ser consequência. Não crie muitas expectativas e entregue a sua verdade e o seu melhor.

Publicidade

Publicidade