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Chavoso da USP deseja mobilização dos jovens contra ‘Novo Ensino Médio’

CAPRICHO bateu um papo com Thiago Torres, estudante e YouTuber, sobre o poder da nossa galera para transformar a educação

Por NAIARA ALBUQUERQUE Atualizado em 29 out 2024, 18h46 - Publicado em 19 abr 2023, 00h10
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ó a mobilização social vai trazer a revogação do Novo Ensino Médio, afirma Thiago Torres, mais conhecido como @chavosodausp. Para quem não o conhece, Torres ganhou reconhecimento em abril de 2019, após compartilhar um texto nas redes sociais sobre as dificuldades de atravessar a cidade para cursar Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP). De lá pra cá, sua vida mudou, mas o desejo e sonho de mudança por um mundo melhor – além de seu estilo chavoso – seguem mais vivos do que nunca.

Nós, da CAPRICHO, conversamos com ele em um papo descontraído sobre planos para o futuro, referências musicais e, principalmente, a Educação como um todo e sua percepção sobre o Novo Ensino Médio – além dos ataques violentos recentes que rolaram em escolas pelo país e nos deixaram ainda mais apreensivos e ansiosos. Spoiler: pra ele, não tem risadinha sobre esse projeto, é preciso revogar o quanto antes.

Aqui cabe uma pequena explicação: no início de abril, noticiamos a decisão do governo Lula em não revogar, mas suspender e rediscutir o projeto do Novo Ensino Médio. No período, muitas entidades estudantis se posicionaram contrárias ao projeto, principalmente pela dificuldade de implementação nas escolas públicas.

Torres cursa desde 2018 licenciatura e bacharelado em Ciências Sociais na USP. Com o diploma na mão, ele sonha em palestrar em Fundações CASA (Instituição focada em medidas socioeducativas para menores infratores; antiga FEBEM) em São Paulo e escolas públicas por todo o Brasil. Ele nasceu e cresceu na Brasilândia, no extremo Norte de São Paulo e, aos 23 anos, conta que seus pais são de origem nordestina e que estudou a vida inteira em escolas públicas estaduais.

Onde vai parar o 'Novo Ensino Médio'?

No mês passado, estudantes de todo país foram às ruas em atos pela revogação do Novo Ensino Médio, como mostramos aqui na CAPRICHO. A novidade é que, diante das pressões que não cessaram, o governo Lula está preparando uma portaria (que é um documento com instruções sobre a aplicação de alguma lei ou regulamento) para suspender a implementação do novo modelo.

 

“Meu trabalho é sobre conscientização política, divulgar ideias sobre sociologia, política, história e cultura periférica”, ele afirma com muita segurança – e, ah, ele também é militante do movimento batizado de Mandela Free que atua na Favela São Rafael, em Guarulhos.

E não à toa sua presença nas redes sociais é gigante entre a nossa galera. Tanto que, em abril, ele respondeu um tweet do apresentador Luciano Huck sobre o projeto do Novo Ensino Médio. E, pois é: a publicação com sua reação ao comentário teve mais curtidas do que a postagem original.

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Texto de Tweet do Luciano Huck e resposta
Luciano Huck recebeu críticas em sua conta do Twitter Twitter/Reprodução

“A gente não via pessoas com o meu perfil ‘chavoso’ falando sobre universidade, estudos e política. E muita gente começou a me seguir porque se viu ali representado ou inspirado em mim”, conta à CH. E, sim, isso é importante demais. Mas ó, além de detalhes sobre seu engajamento como militante nesses temas, ele também compartilhou com a gente o que não sai da sua playlist. Anota aí: MC Hariel, Mc Don Juan e a MC Pipoquinha estão entre os principais artistas.

Abaixo a gente te conta com detalhes. Vem ler a entrevista completa:

CH: O que mudou na sua vida de 2019 pra cá?

Thiago Torres: A minha vida mudou completamente. Desde que eu me tornei uma figura pública, na verdade. Tudo mudou quando eu publiquei aquele texto com uma foto minha. Eu sinto que ali sem querer eu iniciei um movimento. Porque a gente não via pessoas com o meu perfil ‘chavoso’ falando sobre universidade, estudos e política. E muita gente começou a me seguir porque se viu ali representado ou inspirado em mim. Eu me vi com muita responsabilidade. De lá pra cá, recebi convite para palestrar na Fundação CASA e também em escolas.

Quero dar aula de sociologia nas escolas mesmo.

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CH: Como você avalia o projeto do Novo Ensino Médio?

Thiago Torres: A revogação é fundamental. E o projeto ainda não foi revogado, né? Eu sempre chamo de Novo entre aspas, porque é um retrocesso. O que o governo precisa fazer é retomar uma consulta pública para ouvir educadores, estudantes e pessoas relacionadas à área da educação. Agora, foi uma suspensão que eu vejo como positiva e ela é uma conquista nossa, fruto de luta e de pressão. Se a gente não tivesse feito todo esse barulho nas redes sociais e nas ruas, nada disso teria acontecido.

Temos que lutar contra esse Novo Ensino Médio. E também contra o Programa de Ensino Integral (PEI) e o Novo Plano de Carreira que foi imposto pros professores também. Eu acredito que se a gente continuar lutando, continuar pressionando, fazendo manifestações, a gente vai conseguir. Além disso, eu defendo a organização de uma greve geral da educação. De uma paralisação das aulas com a ocupação das escolas retomando aquele movimento de 2015 e 2016.

E aqui cabe uma contextualização: eu me formei no antigo ensino médio, em 2017. E era uma porcaria. O que eu aprendi no Ensino Médio não me preparou para a vida e muito menos para o Enem. Das seis aulas que eu tinha todos os dias, pelo menos três eram vagas. Ou seja, eu não tinha professor. E o Novo [Ensino Médio] entre aspas é muito pior. É como se pegassem o que era ruim e transformassem em algo terrível.

CH: Por que você é contra o ensino integral?

Thiago Torres: O governo Doria junto com o Rodrigo Garcia (ex-governador de SP) começaram a impor o modelo de Programa de Ensino Integral (PEI) a todas as escolas estaduais. E de uma forma tão absurda que não se preocupa com a realidade dos estudantes pobres e trabalhadores. Muitos estudantes foram obrigados a abandonar os estudos. Eu vejo isso nas visitas às escolas que faço.

A gente estuda o passado para entender o presente e imaginar o futuro.

Thiago Torres (ochavosodausp)
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CH: Como esse ‘Novo’ Ensino Médio pode aprofundar as desigualdades?

Thiago Torres: Então, eu tenho ouvido muitos relatos nas escolas, de professores e de estudantes. Nas escolas particulares, esses alunos não deixaram de ter as matérias fundamentais. De biologia, química e física. Os itinerários aparecem como algo a mais e não substituindo essas matérias. Algo bem diferente da escola pública, né? Lá, com esse projeto, você pode deixar de ter química, sociologia e arte, por exemplo. Isso porque as escolas públicas, na grande maioria, não têm condições materiais de oferecer todos os itinerários formativos, né? O que essa reforma faz é pegar as disciplinas e transformar em áreas do conhecimento

Outro ponto é que eles vendem com uma liberdade de escolha, mas um aluno de 15 ou 14 anos não tem condições de escolher o que ele quer porque ele nem teve acesso às possibilidades.

CH: Recentemente, você fez um comentário no Twitter do Luciano Huck sobre essas diferenças entre escolas particulares e públicas. (Nós noticiamos o caso aqui). Como essas desigualdades se evidenciam?

Thiago Torres: É isso. Os filhos dele estudam em escolas de altíssima qualidade, que teria acesso a todos os itinerários. No ano passado, eu fiz um estágio em uma escola na cidade Tiradentes, que fica no extremo Leste de São Paulo. E lá tinha um itinerário de musicalidade. E na escola não tinha nenhum instrumento musical. E sabe o que o professor fazia? Levava balde, panela, colher de pau, enfim. Tudo isso para simular instrumentos musicais. Agora, imagina uma aula de musicalidade numa escola particular. É bem diferente. O problema é que na escola pública não tem recursos para que as aulas sejam atrativas.

CH: Como está a sua expectativa para o atual governo federal? O que deveria entrar como prioridade na Educação?

Thiago Torres: Olha, a gente teve um pequeno avanço com a eleição do Lula e um grande retrocesso com a eleição do Tarcísio para o governo estadual de São Paulo. Agora, em relação ao governo federal, eu falo que tivemos um pequeno avanço porque a gente elegeu o Lula e o Alckmin. Olha a contradição: a gente passou os últimos anos aqui em São Paulo denunciando tudo que o governador pelo PSDB, o Geraldo Alckmin, vinha fazendo com as escolas públicas pra gente se ver agora diante desse cenário. Por isso, precisamos entender os riscos e também cobrar o Lula como presidente. E eu vejo que ele está com a oportunidade e com a responsabilidade muito grande em mãos para conseguir reverter várias desgraças que foram feitas aí no Brasil desde o golpe 2016 (o impeachment da presidenta Dilma).

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Agora, a grande prioridade da educação do Lula tem que ser revogar essa reforma do ensino médio e retomar os debates que vinham sendo feitos para pautar uma nova base nacional comum curricular. Isso precisa ser retomado.

O adolescente hoje está completamente preso em um presente torturante. Ele não conhece o passado e ele não vê futuro. Por isso que está essa loucura, essa onda de violência nas escolas.

Thiago Torres (@chavosodausp)

CH: E pra você qual a importância de conscientização dessa galera?

Thiago Torres: Desde 2016, com o governo Temer e depois com o governo Bolsonaro, tivemos muitas medidas que mataram qualquer esperança de futuro para a juventude, principalmente relacionado à educação. Eu vejo que fazer uma faculdade é algo muito menos atrativo para os jovens e adolescentes. Houve uma tentativa de desmantelamento do ensino, principalmente das universidades públicas sendo vistas como um lugar de doutrinação comunista. Muitos jovens já não tem nem expectativa ou sonho de fazer uma faculdade e até mesmo de conseguir um bom trabalho, já que as pessoas não conseguem trabalho nenhum. Quando muito elas vão virar entregador de aplicativo, motorista de Uber. As pessoas não conseguem nem sonhar com um futuro diferente. E elas nem conhecem o passado, sabe? Então o jovem, o adolescente hoje ele está completamente preso num presente torturante. Ele não conhece o passado e ele não vê futuro. Por isso que está essa loucura, essa onda de violência nas escolas. É necessário entender o que foi feito do nosso país nos últimos anos.

As ocupações secundaristas que aconteceram eu vejo como um caminho de inspiração. É um caminho a ser seguido. Eu sei que a gente fica sem saber o que fazer muito bem. Mas é isso: a gente estuda o passado para entender o presente e imaginar o futuro.

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