Quem faz tudo nas festas de fim de ano e por que são as mulheres?

Precisamos falar sobre a invisibilidade do trabalho de cuidado nesta época do ano também.

Por Juliana Morales Atualizado em 24 dez 2024, 17h04 - Publicado em 21 dez 2024, 17h00

Ei, jovem, você já parou para pensar em todo o trabalho por trás da ceia maravilhosa que você saboreia em todo Natal em família? Ou quem pensa na maioria dos detalhes para a viagem do Ano Novo acontecer da melhor maneira? Muitas vezes, ao ver as festas prontas e tudo funcionando bem, nem lembramos de todo o processo até chegar ali e, principalmente, de quem fez tudo aquilo acontecer.

Nessa época, as mulheres da família carregam a maior responsabilidade da organização a execução das tarefas. Elas estão, em maioria massiva, na cozinha – não é à toa que, normalmente, nessas datas, tem a receita famosa da avó ou a lasanha da tia. Mas não para por aí: tem que preparar a decoração, se preocupar com a limpeza e com a recepção dos convidados, já reparou?

“Mesmo não sendo remunerado, tudo isso é trabalho e leva tempo e dedicação”, pontua Georgia Nicolau, diretora de parcerias e institucional do Instituto Procomum. 

A especialista destaca que essa dinâmica desigual entre os gêneros nas festas de fim de ano fazem parte de uma construção humana – que, diferente do que muitos pensam, não tem nada de biológico. Ou seja, não é que mulheres nascem com mais aptidão para cozinhar e organizar festas, mas essa ideia foi sendo construída ao longo dos anos.

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“Desde os tempos primórdios, os seres humanos fazem festas, rituais e celebrações. E alguém teve que preparar essa festa, cozinhar e pensar em tudo”, diz Georgia.

O problema ainda maior é que esse tipo de responsabilidade e trabalho recai sobre o sexo feminino não só no Natal ou Ano Novo, mas durante todo o ano. Uma pesquisa de tendência de consumo, realizada pela Globo, mostrou que o brasileiro está comendo mais em casa e preparando sua própria comida – a maior motivação para isso é poupar dinheiro.

Nesse cenário, 48%  afirmam que cozinham todos os dias. E adivinha quem mais fica na cozinha? Sim, as mulheres. De acordo com o levantamento, 77% das mulheres cozinham refeições em casa em uma semana típica, em comparação com 54% dos homens.

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Apesar de todos nós precisamos de cuidados, como uma comida feita ou roupa lavada, para que seja possível viver, trabalhar, produzir e ganhar dinheiro, o trabalho do cuidado não é reconhecido como deveria.

Essa, inclusive, foi a discussão levantada pela proposta de redação do Enem 2023, que teve como tema os “desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”.

Ao negligenciar esse trabalho não remunerado, de afazeres domésticos e criação dos filhos, a sociedade contribui para o desgaste físico e mental de muitas mulheres – principalmente daquelas que estão em situação de vulnerabilidade social e não tem recursos financeiros ou uma rede de apoio.

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O tema dos cuidados é um problema antigo, mas entrou na agenda pública pela primeira vez neste ano. O projeto de lei que institui a Política Nacional de Cuidados, que estabelece que  todas as pessoas têm direito ao cuidado (direito a cuidar, a ser cuidado e o direito ao autocuidado), foi aprovada na Câmara dos Deputados e no Senado Federal recentemente. Agora, o texto aguarda sanção presidencial. 

A secretária nacional de Cuidados e Família do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), Laís Abramo, celebrou a aprovação do projeto de lei pelo Congresso Nacional e destacou a importância do avanço em texto publicado pela assessoria de comunicação do órgão.

“As mulheres dedicam pelo menos o dobro do número de horas semanais a esse trabalho de cuidados não remunerado dentro das famílias do que dedicam os homens. E com o envelhecimento populacional e a redução do tamanho das famílias, este arranjo fica insustentável. O Estado precisa assumir seu papel neste campo”, afirmou.

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Mas você, jovem, também pode fazer sua parte nessa questão do cuidado, viu? E pode começar pela colaboração nas festas de fim de ano. “E se todo mundo cozinhasse conjuntamente ou e se houvesse uma divisão de tarefas? Cada um faz uma coisa ou leva um prato e todo mundo pensa na decoração junto”, sugere Georgia, enfatizando que é possível driblar a sobrecarga.

 

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