Quem será que tem medo da fé alheia?
Especialistas explicam à CAPRICHO porque a intolerância religiosa é (muito) grave para todos
O que aprendemos em uma uma sociedade judaico-cristã como a nossa é que a Bíblia ensina à todos que é preciso “amar e respeitar os outros, independentemente das suas diferenças”, certo? Mas conseguimos observar que não é bem assim que acontece na prática: o preconceito e intolerância chega também ao campo das religiões, mesmo com um sincretismo (ou seja, uma mistura e diversidade de religiões) muito grande por aqui.
Mesmo que tenha tudo para ser um país seguro para que as pessoas exerçam sua fé livremente, na prática, pessoas ainda são vítimas de intolerância religiosa – um crime considerado inafiançável e imprescritível. Hoje, dia 21 de janeiro, é marcado como o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.
Nós da CAPRICHO fomos perguntar a especialistas porque isso acontece e como podemos mudar esse cenário em nosso país. Vem com a gente.
“A intolerância religiosa é uma forma de discriminação que tem graves consequências sociais e culturais, incluindo divisões entre as diferentes religiões e conflitos que podem prejudicar a harmonia social. Essa intolerância também pode levar a discriminação, opressão e violência“, afirma o jornalista e teólogo Gutierres Fernandes, autor do livro Quem tem medo dos evangélicos? (Editora Mundo Cristão) à CAPRICHO.
E os dados provam essa mistura religiosa que comentamos acima, mas também mostram as que prevalecem e que ao mesmo tempo: 50% da nossa população é católica e 31% é evangélica, um número bem expressivo, né? As informações são de pesquisa Datafolha realizada em 2020.
Mas em que lugar ficam as religiões de matrizes africanas, que também alimentam a nossa cultura de forma muito intensa? Apenas 2% da população brasileira declara ser da umbanda, candomblé ou outras religiões afro-brasileiras.
Outros dados, coletados pelo Disque 100 do Ministério dos Direitos Humanos, colocam esses números em perspectiva: as religiões afro, como o candomblé e a umbanda, são os principais alvos da intolerância no Brasil. Especialistas contaram pra gente que este dado espelha uma questão grave e que é motivada pelo preconceito e pelo racismo.
“[A intolerância] É uma busca por segurança e afirmação da própria identidade através da rejeição dos outros como estranhos”, explica, que reflete que o próprio cristianismo já foi perseguido. Hoje, contudo, os próprios evangélicos se tornam algozes da intolerância, por exemplo.
“Quando a gente está no templo, as pessoas veem o povo preto como um povo de servidão”, diz Vanessa Èṣùfunkę, Sacerdotisa do templo de umbanda Encontro Sagrado Família Pena Branca à CAPRICHO. Vanessa ainda destaca que, quando a população negra chegou ao Brasil, precisaram adaptar suas crenças por causa do cristianismo, uma religião majoritariamente branca, sendo que o senso comum a trata como uma religião “mais aberta”.
E mais: de acordo com dados da GloboNews, o Brasil registrou três queixas de preconceito religioso por hora em 2022. “É vital combater a intolerância religiosa para proteger os discriminados e preservar a liberdade religiosa, bem como promover a harmonia social”, alerta o teólogo. Para ele, seria necessário manter um diálogo aberto entre as religiões, compartilhar conhecimentos verdadeiros e desestimular estereótipos perigosos.
O teólogo aproveita para reforçar que a tolerância é um valor fundamental na fé cristã. “A Bíblia ensina aos cristãos a amar e respeitar os outros, independentemente das suas diferenças. Amor, paz e bondade são virtudes esperadas de um cristão verdadeiramente espiritual.”
A tentativa de impor uma religião a todo custo também é uma forma de praticar intolerância, uma vez que essa imposição caminha lado a lado com a segregação, dando a ideia de que uma religião é superior que a outra, por diferentes motivos.
“No entanto, é importante lembrar que a tolerância não significa necessariamente concordar com as opiniões ou comportamentos dos outros, mas sim respeitá-los enquanto indivíduos“, finaliza o especialista.